Páginas

Caminhos...


Passo largo e decidido, com o negro a pintar o corpo e o vento a moldar o cabelo…
Não sei de onde vem, não sei para onde vai, nem isso é importante nos momentos em que por lá passo cruzando-a… Ora num ora noutro sentido da estrada mais alta que fronteira a colina entre a água e a terra.
Vejo-a sempre a caminhar indiferente ao Sol ou tempestade…
Comecei por vê-la quando o calor tímido de Abril espreitava curioso por entre as nuvens… alguns dias depois quando a Primavera anunciava as andorinhas…de novo quando o Verão trazia buzinas e pessoas em fato de banho dentro de carros cheios de risos e impaciências de praia…mais tarde com a Lua a levantar-se mais cedo tornando mais preguiçosa a luz…
Vejo-a muitas vezes…tantas que já nem lembro…e deixei de contar…
Mas sempre que por lá passo …abrando o passo como que a provocar que apareça…
Umas vezes consigo…outras nem por isso. Se a vejo faz-me sorrir…se não sorrio também, porque sei que anda por ali…talvez até brinque ás escondidas com a minha vontade e ria baixinho atrás de uma pedra nua de preconceito cúmplice, vendo-me ao longe a troçar de mim…
Não lhe sei o nome, nem o que vejo me sugere seja o que for…porque hei-de dar-lhe um?
Não lhe conheço morada, acho até que ela só existe para mim… e o que vejo é apenas uma historia num filme imaginário?
Não sei sequer se fala e em que língua…mas também isso não tem nenhuma importância…ou terá?
Acho que a sinto e quero como uma arvore solitária e rara como as que existem por ali, lutando contra as vontades das estações, despreocupadas com a passividade dos amantes da estrada.
Não sei quem és, nem a cor dos teus olhos, nem de onde vens, nem em que dialecto te exprimes…mas quero ver-te sempre que por aí…assim mesmo de forma egoísta , porque me provocas o sorriso na vontade que o pensamento sugere…não fujas… nunca…

Cruzamentos no tempo


Numa encruzilhada sem tabuletas nem semáforos, olho em redor, tento ver de forma atenta o mais longe que os olhos permitem focando na opção infinito da retina.
Mas o nevoeiro é grande nos quatro pontos cardeais...
Não sopra uma brisa, não há árvores onde pousem os chirlreios matinais.
Um cão ouve-se ao fundo num latir abafado, o cheiro é de terra ainda humida após as chuvas da última noite.
O Sol mostra-se a medo a nascente...e adivinho-lhe os passos até se calar de novo por mais uma noite ali do outro lado.
Neste centro da calma, hoje não se passa nada...nem o sr. D me vem propor o pacto eterno em troca da alma.

Espirros



Chegámos de novo à época do espirro… não que seja uma norma, mas a verdade é que na mudança de estação o espirro vem quase sempre por acréscimo, e aumenta o negócio do lençinho de papel, dos pingos para o nariz, do soro fisiológico e de todos os acessórios mais ou menos hightec do espirro.
Torna-se frequente o espirro nos transportes públicos a que ninguém pode fugir das consequências tantas vezes molhadas e maioritáriamente também sempre muito perfumadas, nas repartições de finanças em que nunca se sabe muito bem de onde vem mesmo seguindo o som e que deteriora formulários alterando os rendimentos e a possibilidade de coimas por falsas declarações, o espirro ao volante em que dava um jeitaço a muitos ter as escovas do lado de dentro, os espirros do vizinho durante a noite que atravessam paredes e nos entopem o sono, o espirro que se nos chega sem avisar no meio de uma reunião em que nos dá vontade de sermos operados a uma merda qualquer que nos resolva o problema para não termos que espirrar mais, o espirro do dentista que nalguns felizmente os fazem virar a cabeça para o lado mas desleixam a broca e lá se solta mais um saltinho no agarrar com mais força os braços da cadeira deteriorando o material.Lembro-me de ser chavalito e ir a um dentista ali perto da casa dos bicos no jardim das cebolas…que raio de sitio para ter um consultório…o mobiliário era novinho, cor de rosa quase choque e assim se manteve durante os anos que por lá passei para tratar dos dentinhos de leite e assegurar os futuros, que não tiveram um futuro propriamente risonho mas isso é outra história…mas então o senhor doutor enquanto me tirava dentes e fazia o que hoje se chamaria um checkup, ia assobiando e operando o meu esmalte como se nada fosse, e sem máscara nem nada…eu apesar de pequenino de ideia e idade sempre achei que estar e levar com o bafo assobiante do homem, misturado com fados e nacional cançonetismo não estava com nada e acredito que se a DECO já existisse o livro de reclamações não seria propriamente virgem, mas felizmente nunca me lembro de ele me ter espirrado para cima. Nessa altura lembro-me que havia um de dois prazeres que me seduziam e que exagerava até me deixarem. Um dos rituais dessas visitas era o acender daquela luz de dentista, o baixar do braço basculante e o apontar…aquilo sim era um momento inesquecível talvez pela temperatura da luz…lembro-me que uma vez que ele se ausentou por momentos para atender um telefonema eu acendi e apaguei aquilo as vezes que o tempo e a margem de segurança para me voltar a sentar sem risco que se percebesse deixou…acho que talvez tenha sido o meu primeiro fetiche…depois o outro era o pegar num copo de porcelana depois de carregar num botão em borracha deixar a água encher quase até transbordar e depois bochechar, bochechar bochechar até a assistente anafada e de óculos com corrente dourada pendurada, que me fizeram pensar se ela teria medo que alguém os roubasse... “Pronto já chega menino”, e cuspir a água para a bacia também de porcelana sempre com água a correr durante o bochecho…era um prazer porque cuspir era falta de etiqueta era proibido pela boa educação imposta e aquilo libertava-me assim de forma inigualável e não havia stress que entrasse por ali dentro.
Ahhh e havia mais, o poder comer um gelado depois do dentista…esse era outro dos momentos que adorava depois da repetitiva frase do senhor doutor no final de caa consulta: “ Muito bem o menino portou-se aí como um general, hoje tem direito a gelado"…
Mas voltemos ao espirro. Temos os espirros tenores, sopranos, contra altos, e para todos os gostos. Um dia se tentares analisar os espirros de todos os espirantes das redondezas, vais ter uma vontade enorme de te rir. Eu gosto particularmente dos múltiplos…daqueles que quando começam a sair se topa logo que aquela pessoa vai ter graves problemas nos próximos momentos…lembro-me de alguém que cada vez que espirrava o fazia 17 vezes…era uma delícia imaginar em câmara lenta o chegar do espirro o inspirar na preparação do espirrar e o espirro propriamente dito, assim incontrolável. Os espirros prolongados tipo atchimmmmmmmmmmmm, os precoces mais conhecidos por meio espirro, os silenciosos e tímidos como uma convulsão, os fininhos em que nunca se percebe bem se quem os dá espirra ou diz que sim a qualquer coisa, os sonoros que se ouvem nos trezentos metros quadrados circundantes e em que são continuados com o acto de tirar o lenço do bolso de trás das calças para um assoar dos restos que ficam nas redondezas. O espirro gago, A A A A AAAtchimmmm. Tantos espirros que nunca mais saia daqui e ainda me constipava.

Agora que este blog tem áudio desafio-te a espirrares e a gravares todos os espirros do agregado familiar e amigos para um microfone e me enviares esses sons para eu fazer um best of do espirro português. Fico à espera, com a promessa de assim que o numero justificar, fazer um ficheiro de todos os que receber para quem os quiser ouvir.

embloglio@free.fr

Santinho…

Sonetando



Do escuro recear
Do sonho pular
Do cimo saltar
Do céu apagar

De sede matar
De calma beber
De espanto voltar
Da noite errar

De silêncio fugir na luz abraçar
Do sol atear no encanto espraiar
Do ter sentir e não se querer

De chuva molhar na água beber
Do espaço de terra no vento soprar
De dentro do canto a força vingar

Nickelback - Photograph(Audio)



As memórias musicais associam-me momentos do património emocional.
Depois há outras músicas que oiço pela primeira vez e que vão fazer parte das tais de momentos especiais, porque diferentes, porque mais intensas, porque as sinto assim.Foi assim com Sultans of Swing dos Dire Straits, com Kaleigh dos Marillion, e …tantas outras.
Apesar de gostar dos NIckelback este Photograph ouvi-o pela primeira vez na marginal a caminho de Cascais, também numa noite de chuva miudinha daquelas que fazem abrandar a marcha e pensar que por vezes sabe bem interromper o silêncio por uma boa causa … e vai tocar muito noutros tantos km de estrada
O tema não está intencionalmente em versão de qualidade …é apenas uma referência.
Não há por aqui nenhum pirata audiófilo.

Primeira chuva


Acho que nunca me soube tão bem senti-la de novo. Há muito tempo que a sensação se tinha divorciado da memória que nos sustenta os prazeres.
Gosto de ficar assim a olhá-la, enquanto me desafia o toque, provocando-me a vontade de todos os sentidos visíveis…e os outros, que se sentem, a cada momento que se nos passa. E ela ali a desafiar-me, num balanço suave, fiel à brisa despreocupada de domingo…e o cheiro…e a forma …e os movimento decididos
tocando-se em espectros, nas cores da imaginação.
Dou-lhe a mão esticando todos os dedos como se fossem poucos, na vontade de a tocar … ela a soltar-se…primeiro tímida…depois até abafar com um suspiro, tudo o que era ruído à nossa volta… e logo de forma crescente fazendo ouvir-se, ainda mais forte, mais alto… quase no auge… molhando…molhando-se…molhando-me.
Logo depois…tornou-se invisível… e fez-se esquecer… até à próxima vontade de se soltar…
Fiquei por ali… deixando secar, as gotas que dela sobraram… para que ma trouxessem de volta… numa próxima vez.

Bota lá pá


“Isto anda tudo ligado”, dizia o Sérgio, já lá vão muitas eleições para todos os gostos de vencedores e vencidos.
Estas autárquicas, dizem, vão servir para mostrar cartões ao governo…futebolizando o tema, até porque a bola é redonda e a pontinha da caneta com que se vota também. Uns apelam a um voto de desconfiança no executivo, outros apelam ao voto de confiança ao executivo, outros apelam que não se ligue ao executivo e se vote para a autarquias, nas autarquias não se pensa no executivo, o executivo farta-se de pensar nas autarquias em tempo de eleições… … … percebi agora depois destes anos todos porque é que quando era chavalito entrei por ali dentro e quis com um boletim de brincar exercer o que achava o meu direito, a presidente da mesa de voto me disse que eu ainda tinha que crescer muito antes de poder exercer o meu direito cívico. Aquilo era mesmo só para adultos e e…
O José “agarrou” com todos os braços que tinha, o rectângulo mais imperfeito que nunca, não sei se o seu nível académico lhe permite melhorar a forma do cada vez menos quadrilátero nacional, mas acredita que desejo muito que o senhor José tenha jeitinho para o desenho, pode até ir para aqueles cursos rápidos de nacionaldesign…ou será webdesign? As autárquicas prometem, e prometem muito até porque tenho a certeza que as surpresas têm sempre um gosto bom, mesmo fora do período natalício.
Um dos futuros candidatos virtuais a Belém espera por segunda-feira para anunciar se se deixa de virtualismos, dá um murro na mesa começa a treinar para a corrida ao palácio rosa. Coitado do homem…ainda ninguém percebeu que este tempo todo de espera se prende coma sua decisão calculista de escolher a melhor foto para o boletim de voto…e mais, a primeira coisa que o senhor Silva fará caso as presidenciais se alaranjem é vestir o fatinho de macaco da mesma cor e pintar o palácio da mesma cor para não destoar.
Se o Mário for o feliz contemplado acredito que não vai mexer na pintura rosa…até porque corre o risco de sem pó de arroz se notarem ainda mais as rugas. De resto muito mais que pinturas de parede ele é um adepto de outras pinturas…
O que eu gostava mesmo era que o desfecho fosse como este tempo de mudança…incerto. E nenhum dos dois dinossauros do Jurássico Portugal chegasse ao cimo da montanha, mas que a poesia trouxesse Maomé ao cenário.

Ahhhhhhhhhhhhh… agora a sério, não te esqueças…mostra que és português, grande, consciente e responsável… VOTA.

Impossibilidades gestuais (Audio)


O local familiar, o gesto comum o cheiro habitual, o vapor teimava em voltar a soltar-se da água que se deixava levar… o primeiro duche quentinho sinal de que o Inverno apronta-se a trocar com o Outono noutro ano ímpar…disse-me um dia alguém que são melhores que os outros. Até aqui tudo velho…não fosse um percalço de percurso que me trocou de destro a canhestro por uns dias. Este início parece sorridente mas o caso é grave e pouco dado a risos e serpentinas de Carnaval.
Peguei no chuveiro com a mão menos habitual, e notei que tinha levado o dobro do tempo a borrifar-me…o gel de banho tornou-se quase uma paciência impossível de terminar, para não falar em shampoo…resumidamente…o conceito comum de duche, tinha-se tornado num Inferno. Pus-me em causa, pus membros em causa, pus o cenário em causa…
Assumi que sou um destro gravemente dependente. Senão vejamos…
Já tentaste borrifar-te com a outra mão? Sim aquela que abre a torneira. Porque abrir a torneira não é tão fundamental quanto o borrifares-te…acho de resto que quando se diz…estou-me a borrifar para isso…imaginamos esse sentimento feito com a mão menos hábil, porque o acto de borrifar não é importante nem merece esforço…é à balda, à Lagardère, à vai de embute, não me interessa, e tenho raiva a quem sabe… a maioria dos gestos desprezantes são feitos com a mão menos dotada porque não são importantes.
Tens dúvidas? Pensa lá melhor, e diz-me se já alguma vez te masturbaste com a outra mão? Elementar…não? Isto daria uma tese de doutoramento…
Agora, e ainda no cenário do duche matinal ou antes do encontro nocturno com Morpheu experimenta por o duche na outra mão…sim a tal que não dá onanísticamente jeito nenhum, e depois percebes…quando tentares fazer com o mesmo à vontade gestos tão comuns da tarefa de tomar banho. Agora, se realmente já está tudo lavadinho e não notaste diferença… os meus parabéns.
Mas como sei que esse sorriso narcísico não te fica nada bem, passemos ao nível imediatamente a seguir…Agora voltas a espalhar o gel de banho no corpinho, pões pastinha de dentes na escova ( porque todo o português que se assume tem uma escova de dentes na banheira) e preparas-te para dois em um… A ordem de pegar em cada mãozinha na escova de dentes e no chuveiro fica ao teu critério…Começa a borrifar-te para tirar o gelzinho de banho e escovar os dentes ao mesmo tempo…e por amor de todos os santinhos, sê honesto e diz-me se conseguiste, sem ao menos ofender algum familiar desses objectos de limpeza pessoal, completar essa tarefa tão simples e de todos os dias…com o senão de apenas se executarem ao mesmo tempo. E como não é só o Entrocamento a terra dos casos raros experimenta se conseguiste com êxito os passos anteriores, volta a repetir mas desta vez tirando o gel de banho de um dos pés, com o outro. Se ainda te achares capaz de tudo isto sem esforço experimenta tirares o shampoo com os movimentos circulares do chuveiro escovando os dentes a uma velocidade não proporcional à do chuveiro.
Eu não consegui terminar a segunda fase…o caso é grave e só me falta mesmo tirar a última dúvida, será que a outra mão é mesmo tão desajeitada noutro tipo de manipulações?…se assim for… começo a procurar já amanhã um psi que me trate da pdi.

Ditado francês (AUDIO)




Bom dia Portugal e arredores. O egocentrismo lusitano permite-me falar assim, é um direito que me assiste e “má nada”, até porque o nosso umbigo nunca esteve mais exposto…a falta de água provoca estes despires, mas felizmente que estamos no fim do Verão e espero que ela se venha, em múltiplos de muito.
Eleições à porta ou a outro qualquer canto da casa provocam falatório, debates, crónicas, conversas de café, taberna ou explanada, de cabeleireiro, salão de chá, e todas as outras que não vale a pena citar sob risco de me voltarem a chamar “palavroso” …e não me apetece …pronto. E os candidatos sorriem e estrabucham e fazem cenas e o vírus propaga-se tipo pandemia europeia aos políticos, poder local, associativismo, clubismo e seus derivados. Os média tornam-se concorrentes dos CTT aceitando recadinhos com cobertura mediática e o país assim não vai lá porque quem quer comunicar tem que escrever a cartinha comprar o envelope, e lamber o selo deveria tornar-se o êxtase da comunicação, e postar o todo, o concretizar do acto em si…ou noutra nota ou tempo verbal qualquer. Os pensionistas nunca estiverem tão contentes com o período político como agora…faz-me lembrar umas quaisquer eleições em que vi numa campanha um tempo de antena do partido do idoso, até porque o marketing político não pode ter melhor candidato que alguém que sofre na pele este estado, seja ele de, com graça ou não. Bom dia Dr. Mário Soares, cá nos voltamos a encontrar tantos anos depois, consigo ali a preto e branco ao lado dos seus colegas de boletim de voto. Lembro-me do nosso último momento a sós consigo ali, estampadinho em versão 2D, já lá vão vinte anos…quando olhei para si e pela primeira vez tive sem alternativas, que escolher um homem. Nunca me tinha lembrado disso sabe…esta memória desperta-nos coisas do neurónio mais senil que nos povoa o universo cinzento … O senhor tem-me feito mentir estes anos todos , e vai-me obrigar a um pedido de desculpas retroactivo a todos a quem menti…E o senhor está criar-me de novo outro problema. È por falta de alternativas acho que mais uma vez me vou deparar com o ter que o escolher e não quero nem pensar na explicação que Sigmund daria sobre isto . Como é que eu vou explicar a mim mesmo ter que dar o meu voto a alguém que disse o que disse e agora diz que não disse dando o dito por não dito..? No país do seu “ami Mitterrand”, usam uma máxima excelente que não resisto em plagiar, “ Y’ a que les cons qui changent pas d’avis”. Será que vamos ter um em Belém?

A um amigo...aqui tão perto(AUDIO)

20 de Julho - Dia internacional da amizade

Ser amigo, tornou-se banal, toda a gente é amiga segundo a definição fácil que anda na boca do mundo…principalmente o virtual. A Josefa conhece o Afonso na net e passados dois dias de intenso empenhamento falangico tratam-se por amigos. O Manuel que é recém condutor da Carris começa na pausa de almoço a jogar uma cartada no jardim da Estrela e trata os companheiros de sueca por amigos ao fim de duas horas de corte, manilha, e secas a monte. O vizinho do 18º já é amigo da porteira porque ela lhe entrega o correio ainda quentinho e com tratamento personalizado. Os putos são amigos porque jogam à bola juntos e andam ao estalo pela incompatibilidade clubista.
E as amizades coloridas que duram até o guache acabar e as amizades com prazo de validade e as amizades de verão e de todas as outras estações do ano e as de folha caduca ou persistente…o rol é grande, muito grande.
E os amigos dos nossos amigos que são nossos amigos também…diz o povo à boca alta como se de um pregão se tratasse. .. e já agora os maridos das amigas também e os namorados da filhas deles e já agora o merceeiro que vai lá a casa levar as compras e bebe cházinho de limonete na cozinha com a Gracelina que imigrou para Lisboa e também faz parte da família. E depois os primos que sendo da família são amigos também…e dão palmadinhas nas costas ao pai que os convida para grandes devaneios da gula e afins. E há amigos do peito e da perna e da pá e do lombo… amigos comócaraças que são mais que as ofertas de crédito ao consumo.

Mas…
Quando na raridade de um dia menos bom se precisa de apenas um…unzinho só… às vezes até um terçozinho de amigo servia…népia…nestes… rien de rien…estão todos a trabalhar, estão todos ocupados, estão todos numa daquelas reuniões importantes, estão todos com outro problema grave, “ai desculpa lá mas agora não posso mesmo, depois ligo”…e etc e tal ... e que puta de cena esta.

O amigo …é aquele que faz das tripas coração para ajudar, é aquele que está sempre lá do outro lado, mas esses contam-se pelos dedos das mãos…ou talvez…só de uma das mãos… será que chegam mesmo a ser tantos como os dedos de apenas uma das mãos?…estas interrogações castradoras de optimismo cortante que fazem com que os animais de estimação proliferem como cogumelos nas florestas de betão…

E depois… muitas vezes… ou quase sempre…restam aqueles que partiram mas que continuam por cá bem pertinho de onde mais os gostamos de ter… e não escolhem dimensão nem lugar e quase reagem como nós e nos dão o ombro como se de nós fizessem parte… e nos trazem…assim tão simplesmente…de volta o sorriso no meio de um ou outro riacho salgado que teima em obedecer à gravidade…
Os amigos…os poucos e verdadeiros amigos assim… estão sempre tão perto… que de tão perto que estão … nem precisamos chamar…já lá estavam mesmo antes…de precisarmos deles…porque os amigos são uma espécie de anjos…que como eles… também não tem sexo nem idade.

Dimensões

As conversas são como as cerejas mas raramente dão sumo (ainda estou à espera de um kilo delas ...que me prometeram...). Dietético ou calórico, com mais ou menos polpa, de frutas ou legumes, virtual ou fisíco. O liquidificador neuronal girou, seguindo a gravidade a cada elemento. E o abstrato tomou forma, num sumo de cereja a 4 mãos.
--------------------------------------------------------------------------------------------




Alto e magro, crescera sem esqueleto.
Viu-o e desencantou-lhe os ossos e ele conhecendo-se novo chamou-lhe princesa.
Todos os dias roía-lhe os ossos que lhe inventara de forma a convencer-se que eles existiam…
Soubera em tempos pô-los em ordem uns atrás dos outros.
Sentir-lhes as formas, torná-los reais e deixá-los crescer.
Como se tivessem sido sempre parte desse seu tempo, onde a carne se faz vestido, onde o sangue latejante escreve a vida.
Outro Sol descobre-se por detrás da colina imperfeita.
Os sons de gente na cidade a acordar, no zumbido de outro e outro dia.
Ziguezagues, zumbidos, colmeias sem mel, paralelípipedos de betão sem janelas…, precisava de inalar o Azul, cobrir-se com o som do mar, rasgar o peso de todos os Tic-Taques que o sufocavam.
De olhos em bicos-de-pé encarou o SOL…
Cada vez mais a custo, lembrava outras tardes em que o sopro do vento lhe cortava o olhar.
Secava-lhe a boca, na memória sem nexo do adormecer devagar.
Os olhos que teimavam fechar-se e a cidade ali a recomeçar, depois de outra noite no fumo de medo.
Haveria de conseguir, nem que lhe custasse o preço de todo o passado.
O preço do passado…o preço do passado…disco riscado martelando, esculpindo a dor.
Furou os tímpanos, ensurdeceu os fantasmas e gargalhou tão estridentemente que todos os seus vidros se configuraram janelas…
Impotente, oásis do grito, subiu a custo outro lanço de escadas com o soalho por testemunha. Paredes cinzentas pelo pisar de pés, apoio de mãos, conversas baixinho, putos e bolas, cuscuvilhices de vizinhança, amantes sem morada.
A chave que desafiava a ranhura, derradeiro esforço antes da paz do chegar. Pesadelo de sufoco que agitava dois mundos, suor que brotava dos poros, no frio de Novembro.
Deu por si a descer as escadas. Cada passo a dizer não ao cinzento das paredes, não a todos os pés que desconheciam a sua história, não a todos os Novembros que lhe usurpavam e gelavam o Querer.
Viu-se a pisar a rua e fez-se Agosto. Centrou-se em cada passo e descobriu o amanhecer límpido e prazeiroso que lhe nascia das entranhas. Jogou a mão ao bolso e desconheceu: o jogo de chaves, as portas, as fechaduras, que lhe havia aprisionado o Calor.
Correu direito a todos os lados, desejou-se no verde fresco de erva molhada, na sombra de um cipreste…e correu… E reviu todo o sonho enquanto corria, e deixou a vontade levá-lo por onde o pesadelo não quis. E correu…correu ainda mais e mais rápido, para o mais longe que a imaginação inventou. E deixou para trás os tropeções da dúvida, os rituais de iniciático, as palavras pesadas de ordens impostas, os triunfos e as derrotas de quem não era ele, os compassos de músicas que nunca marcou… e no final mais longínquo de todos os fins…aquele que fica para lá da distância segura…parou.
Olhou-se parado, sem pés, sem pernas, sem canga.
Sentiu-se veloz como jamais se conhecera.
Fez-se roteiro, descobriu-se viagem.
Colou todos os favos adormecidos.
E partiu…………inteiro………com gosto de mel…….inalando perfumes inebriantes………

FODA-SE

É brasileiro e "filósofo" urbano. Não resisti a plagiar aqui um texto que já tinha lido há uns tempos e que depois se perdeu num disco reformatado. Obrigado a quem o "mailou". Sugiro um site onde se pode ler mais sobre o autor.
http://www.releituras.com/millor_bio.asp
O texto não é o original, em brasileiro, mas dá para ter uma ideia...se não gostas assim, "que se foda".
___________________________________________________


O nível de stress de uma pessoa é inversamente proporcional à quantidade de "foda-se!" que ela diz. Existe algo mais libertário do que o conceito do "foda-se!"? O "foda-se!" aumenta a minha auto-estima, torna-me uma pessoa melhor. Reorganiza as coisas. Liberta-me. "Não quer sair comigo?! Então, foda-se!" "Vai querer mesmo decidir essa merda sozinho(a)?! Então, foda-se!" O direito ao "foda-se!" deveria estar assegurado na Constituição. Os palavrões não nasceram por acaso. São recursos extremamente válidos e criativos para dotar o nosso vocabulário de expressões que traduzem com a maior fidelidade os nossos mais fortes e genuínos sentimentos. É o povo a fazer a sua língua. Como o Latim Vulgar, será esse Português Vulgar que vingará plenamente um dia.

"Comó caralho", por exemplo. Que expressão traduz melhor a ideia de muita quantidade que "comó caralho"? "Comó caralho" tende para o infinito, é quase uma expressão matemática. A Via Láctea tem estrelas comó caralho. O Sol está quente comó caralho. O universo é antigo comó caralho. Eu gosto do meu clube comó caralho. O gajo é parvo comó caralho.

Entendes? No género do "comó caralho", mas, no caso, expressando a mais absoluta negação, está o famoso "nem que te fodas!". Nem o "Não, não e não!" e tampouco o nada eficaz e já sem nenhuma credibilidade "Não, nem pensar!" o substituem. O "nem que te fodas!" é irretorquível e liquida o assunto. Liberta-te, com a consciência tranquila, para outras actividades de maior interesse na tua vida. Aquele filho pintelho de 17 anos atormenta-te pedindo o carro para ir Surfar na praia? Não percas tempo nem paciência. Solta logo um definitivo: "Huguinho, presta atenção, filho querido, nem que te fodas!". O impertinente aprende logo a lição e vai para o Centro Comercial encontrar-se com os amigos, sem qualquer problema, e tu fechas os olhos e voltas a curtir o CD (...)

Há outros palavrões igualmente clássicos. Pense na sonoridade de um "Puta que pariu!", ou seu correlativo "Pu-ta-que-o-pa-riu!", falado assim, cadenciadamente, sílaba por sílaba. Diante de uma notícia irritante, qualquer "puta-que-o-pariu!", dito assim, põe-te outra vez nos eixos. Os teus neurónios têm o devido tempo e clima para se reorganizarem e encontrarem a atitude que te permitirá dar um merecido troco ou livrares-te de maiores dores de cabeça.

E o que dizer do nosso famoso "vai levar no cu!"? E a sua maravilhosa e reforçadora derivação "vai levar no olho do cu!"? Já imaginaste o bem que alguém faz a si próprio e aos seus quando, passado o limite do suportável, se dirige ao canalha de seu interlocutor e solta: "Chega! Vai levar no olho do cu!"? Pronto, tu retomaste as rédeas da tua vida, a tua auto-estima. Desabotoas a camisa e sais à rua, vento batendo na face, olhar firme, cabeça erguida, um delicioso sorriso de vitória e renovado amor-íntimo nos lábios.

E seria tremendamente injusto não registar aqui a expressão de maior poder de definição do Português Vulgar: "Fodeu-se!". E a sua derivação, mais avassaladora ainda: "Já se fodeu!". Conheces definição mais exacta, pungente e arrasadora para uma situação que atingiu o grau máximo imaginável de ameaçadora complicação? Expressão, inclusivé, que uma vez proferida insere o seu autor num providencial contexto interior de alerta e auto-defesa. Algo assim como quando estás a conduzir bêbedo, sem documentos do carro, sem carta de condução e ouves uma sirene de polícia atrás de ti a mandar-te parar. O que dizes? "Já me fodi!"

Então: Liberdade, igualdade, fraternidade e foda-se!!!

Millôr Fernandes

Take Another Plane



Viajar de avião é, ainda hoje, uma espécie de viagem inaugural do Titanic, onde se chega com uma antecedência mais que comfortável.
Passageiros que esperam em frente ao check-in de armas e bagagens em riste, qual batalha a travar com o inimigo caso este ouse avançar com o carrinho “pesado” para além da margem de segurança permitida pela hierarquia pessoal. E discutem e verbalizam bocas indirectas, na mira de serem compreendidas, ao infeliz parceiro de viagem. Já vi arrancar cabelos, estalos e murros pela conquista de um lugar à frente. Lembro-me sempre daquela máxima que me contavam quando era puto, sobre os frequentadores das salas de cinema que se sentavam na fila A, para verem o filme primeiro que os outros.
Apesar de nesse dia a fila não ter tido nenhuma ocorrência digna de reparo, o caricato veio do outro lado do balcão…será que os funcionários de check-in também são empregados de balcão?...
- O seu relógio está certo?
Perguntou o senhor engravatado de camisa branca.
- Sim o meu relógio normalmente está certo, se bem que não seja made in Suiça mas acho que sim.
Respondi
- É que o check-in fechou há 5 minutos
Enquanto segurava um telemóvel junto a uma das orelhas
- No e-ticket está assinalado para estar às 13 e são 13.05 h. Fechou ou abriu há cinco
minutos?
Perguntei
- Pois mas agora vai ter que esperar pelo próximo voo. Como lhe disse o voo está
fechado e já não pode embarcar.
O diálogo durou mais sessenta segundos até ele decidir que o meu caso era mais importante que o do telemóvel pessoal e decidiu finalmente desligar.
Alguns minutos e estava já sentado na sala de embarque atrás de uma fila que ainda não tinha sequer começado a entrar para o avião. O senhor do check-in estava por certo mal disposto nesse dia.
Meia hora depois estava na manga de acesso ao avião. Uma espera de outros cinco por motivo desconhecido…e finalmente sentei-me. Realmente o senhor do check-in estava fora de tempo nesse dia.
O carrinho dos comes e dos bebes, passa por mim sem parar…até pensei que era o rápido. Mas não. Perguntei depois de quase toda a gente estar servida se havia algum problema ou se tinha sido castigado por chegar atrasado cinco minutos ao check-in.
- Não o avisaram que os passageiros de ultima hora não tinham direito a refeição?
Disse a simpática hospedeira de sorriso escancarado, de onde se conclui que faça vento chuva ou sol um sorriso é sempre um sorriso.
Disse-lhe que não, mas sendo assim…
- Mas se não ao visaram não há problema, aqui tem a sua refeição.
A “refeição ligeira” ligeira anunciada em três línguas pelos comandante tornava-se cada vez mais ligeira…
Fiquei mais aliviado, feliz e confortado, por saber que afinal ninguém morre de fome num avião da TAP com hospedeiras humanitárias em voos de cento e vinte minutos…seja qual for a hora da chegada.
Afinal se a companhia aérea nacional tem vindo a cortar nas despesas, aumentando os preços, porque não cortar mais um bocadinho. Fiquei a saber que afinal não foi um acaso…as refeições aéreas passaram a ser definitivamente uma mini sandes de atum com amostras de ovo, um bolinho seco, copo de água ou sumo e já é um luxo haver ainda chá ou café. Depreendo que em classe executiva, já não deve haver champanhe, e as poltronas devem ter menos molas…mas será que ainda servem sobremesa?
O spot publicitário da companhia já deve estar prontinho a enviar para as agências:
“Viaje com a TAP e saiba que se chegar a horas ao check-in tem direito a uma magnífica refeição a bordooooooooooooo”.
Agora percebo e apresento publicamente as minhas desculpas aos adiantados guerreiros do check-in afinal todas as batalhas travadas por um lugar à frente têm a ver com a lei da sobrevivência nos céus do planeta.
Um dia quando os aviões se tornarem recintos de piquenique aéreo com toalhas de quadradinhos, marmitas de arroz de tomate, pasteis de bacalhau e garrafões de cinco litros, Portugal entra na história como país inventor de um novo conceito de viagens aéreas. Virão turistas de todo o mundo experimentar a sensação de um voo à moda portuguesa em avião panorâmico, com hospedeiras de avental e lenço na cabeça. E em classe executiva, porque isto é para quem pode, haverá uma barraquinha do rei das farturas para distribuir à “volonté” pelos VIP’s desse e doutros Jet’s.

Ganzas mediáticas



Ivo Ferreira tornou-se sinónimo de ganza, mediatizado nos últimos dias depois da sua prisão no Dubai.
O amigo do Ivo depois de uma visita ao Egipto tinha encontrado no bolso do casaco, haxixe misturado com tabaco.
Há quem diga que a denuncia às autoridades do Dubai foi feita pela ex-namorada do amigo ( ai as mulheres são umas invejosas…é o que dá não a terem convidado a visitar a pirâmides).
Toda a gente sabe que no Egipto uma das tradições nacionais é a distribuição gratuita de souvenirs de erva meticulosamente colocada no bolso turista de quem visita o país. Até parece que as autoridades dos Emirato não sabem nem tem conhecimento desta prática secular. De resto toda a gente sabe do franchising jamaicano no Egipto…só os policias do Dubai é que são uns bimbos que nunca foram em turismo ao país de Ramsés

Mas falemos de coisas sérias.

O que é que os pais portugueses vão responder aos filhos, depois de verem no jornal televisivo, um português que foi preso num país do médio oriente, por ter fumado erva, e por estarem os diplomatas portugueses e restantes médias a fazer dele um mártir?

Então mas não é proibido fumar erva no Dubai?
Então mas os pais não me disseram sempre que fumar droga é um acto ilegal e não faz nada bem?
Então mas se é assim porque é que toda a gente está a defender o Ivo?
Afinal estiveram a mentir-me, porque se eu fumar e for preso, afinal não é nada grave.

Estas podiam muito bem ser algumas das muitas questões colocadas por adolescentes perante a noticia do pequeno ecran.
Acho bem que se traga o rapaz para Portugal mas que se lhe faça cumprir a pena cá.
Afinal se nada se disser nem esclarecer, um dia destes vamos ter toda a gente a ignorar a lei, por acharem que o perdão existe para todos os casos.
Os pais de adolescentes têm uma excelente oportunidade mediática para abordar o assunto e esgotarem diálogos a este propósito.

Claro que eu percebo o papel dos pais do Ivo que fazem o que quaisquer outros fariam…livrar o filho e trazê-lo para cá. Claro que os mecanismos consulares devem fazer o seu trabalho. Mas devem fazê-lo SEMPRE…quer seja uma figura mediática ou o comum trabalhador da construção civil que trabalha quase na clandestinidade noutro qualquer país. E o Dubai não é a Holanda…e quem brinca com o fogo queima-se ou faz xixi na cama.

Por posse de droga estão presos duas dezenas de portugueses em todo o mundo…e este número é apenas dos casos conhecidos pela diplomacia portuguesa. Outros tantos vão apodrecer numa qualquer cadeia doutro canto terceiro mundista.

Se virmos este caso de uma forma mais global, será que ao país que vai presidir o Concelho da Europa nos próximos dias interessa pedir o perdão de Dubai por um português que claramente infringiu a lei? E agora que tanto se fala no presidente português Europeu, será que a imagem de Portugal e da Europa sairia valorizada?
Cinco anos de prisão não são o fim do mundo e se calhar até serviam para evitar assim a banalização de casos como este nos nossos putos.

Sai uma bica

Ficar sem perceber , uma conversa, um comentário, um olhar cúmplice, é assim para o inconfortável…diria mesmo que é como um espirro que acaba por não sair…
Quantas vezes já o comum dos mortais ouviu, não percebeu, … mas fez aquele sorrisinho estúpido do pseudo esperto topa tudo de nariz levantado. Pois é, mas depois por dentro ficamos a roer-nos todos…ou não é?
Por isso mesmo hoje fiquei a perceber, o que há quase um ano me atormentava a perspicácia, quase cavalgante para a senilidade. Um sintoma flagrante de uma PDI precoce. Mas não queiras saber como me soube bem o discreto respirar fundo.
Numa cafetaria simpática da zona, que por sinal não tem cadeiras nem mesas, as pessoas levam em média uns 5 minutinhos, para pedir, consumir e ir à vidinha que se faz tarde.
O sr. Zé, homem baixo e de trato afável, começou com o negócio há pelo menos umas três década, fora os ameaços. Era eu puto e ía com o meu avô levar bolinhos caseiros que ajudavam a equilibrar o orçamento familiar. Eram as delícias dos gulosos clientes. Lembro-me do local ser assim como uma leitaria, mas onde se vendia queijo, enchidos, farinhas, massas, azeites, sombrinhas de chocolate e bens de primeira necessidade alimentar tudo sempre muito bem apresentado e arrumado como um puzzle na vitrine frigorifica, que nunca percebi como é que lá tinha entrado…eu e os puzzles…. Ali confluía a terceira idade local para o galão matinal, os tais bolinhos e o chá das cinco, mas…na altura havia três ou quatro mesinhas e as respectivas cadeirinhas. O negócio foi crescendo e o Sr. Zé comprou a loja do lado, depois a outra, e a outra e a outra e as traseiras de todas elas. Os balcões multiplicaram-se, o comércio prosperou, e hoje o Sr. Zé se fosse candidato de qualquer coisa teria futuro político.
Hoje no então espaço da antiga leitaria está uma vitrine frigorifica, mais moderna claro…a outra já não está lá, mas se calhar é porque a porta já é maior que antigamente.
E nesse espaço está apenas uma parte do balcão actual onde em pé cabem umas 20 pessoas. Na outra loja o negócio é também alimentar, mas de almocinhos em pé (claro) com comida super caseira, a consumir no local ou para fora, e padaria e pastelaria de fabrico próprio. Bolinhos de aniversário, bombons e drops e outras cenas que fazem a delícia dos olhares assediados de quem passa. Depois há ainda uma papelaria, tabacaria e afins.
Uma loja de jogos de sorte e azar, com a bênção da Santa Casa e dos SMAS e EDP onde os atrasados pagadores podem tirar o peso da consciência. Ahhhhhh…e ainda num quarteirão mais a baixo um clube de vídeo. O filho que entretanto tirou medicina à custa dos enchidos e afins, abriu uma clínica do outro lado da rua…porque o negócio do lado par é mais para o da restauração.
Voltando à história…o Sr. Zé deve empregar hoje umas vinte pessoas, o que é óptimo porque quando tomam o pequeno almoço o balcão é só deles. E eles são dos mais variados tipos, o Francisco é o braço direito do Sr. Zé, também simpático e conhecedor de todos os cantos da casa, mas depois há brasileiros, brasileiras, portuguesas, portugueses, uma russa, e mais não sei porque aquilo é para mim um momento de pequeno almoço, não vou lá para falar com as vizinhas nem para fazer sala.
E hoje…ouvi de novo…e percebiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii.
Quando a brasileira disse:
- Não tém hávido pasteú dji bácálháu. ( até aqui nada de novo)…
Mas a colega que normalmente serve o sector nascente do balcão, e que quando vou a entrar já está com a mão na máquina do sumo de laranja, se descaiu…ou sou eu que estou a ficar mais inteligente…
- Não sabes? Foi visitar a filha ao Porto ( yesssssssssssssssssssss)
O puzzle ficou ali mesmo todo montado. A equipa dos simpáticos pupilos do Sr.Zé têm um código alcunha para os clientes habituais…
Nos outros 3 minutos de presença no local apanhei algumas…
Bola de Berlim, Amarguinho (só pode ser um gajo que emborca amêndoa amarga), Chapata, Fofinho sem Manteiga (fofinho é um pão, fofo claro), Limonete…
Em 3 minutos…é obra.. um dia destes vou tornar-me detective…
Achei o máximo…eu que até já tenho nomes a mais, ficar a saber que se calhar me chamam Laranja e tarte de amêndoa…acho que agora os vou baralhar e começar a pedir outra coisa.
O método é fantástico para associar ao cliente àquilo que ele pede…e depois dizerem com aquele ar de orgulho profissional:
- Olá bom dia como está? É o habitual não é? Sirvo já.
Saí tosta mista, queijo magro, em pão integral sem manteiga.

Devia ter sangue azul esta,… pensei, ao sair da leitaria, com um sorriso egocêntrico.

Primavera




Toc Toc...não respondes...tiro a chave de cobre do eterno
esconderijo que deixou de ser secreto…Entro sem fazer ranger
a madeira no chão...espreito e sigo o caminho do teu odor
perfumado. O GPS da tua fragrância não me trocou a latitude.
Encontro-te de costas com um sorriso de um sonho bom... meio
coberta pelo edredão cru, com símbolos chineses...aproximo-me...
Mexes-te… descubro-te os contornos… e que o sorriso se foi,
a tua boca abre-se ligeiramente...chego-me mais ...observo-te...
viras-te de novo... deixo a impressão digital dos meus lábios
sobre o teu ombro que se descobre por debaixo da almofada...
sinto-o mexer-se um pouco como que pedindo outro...fico a
olhar-te uns minutos ao som do candeeiro oriental escrevendo
reflexos no soalho.
Faço o caminho de volta pisando o mesmo trilho...fecho a porta...
A noite trouxe a Lua por entre as nuvens.
A Primavera chegou mais cedo... despida...nua.

As cores de ti



Loiros, rebeldes, protesto selvagem, solidários com o vento
Verde água, ver o mundo, que outra cheia molhou
Rosa, do gosto de boca, de beijos assim
O marfim, vivo de cal e sorrisos
Ébano seda, de cheiro, de curvas, de toque suave
Vermelho, de sangue a correr como se os mundos acabassem ali
Azul, do teu céu, que te solta no tempo, donde teimas voltar
Lilás, das flores do teu vaso em janela de água furtada
Amarelo, do odor de limão de velas acesas
Negro, do prazer de olhos fechados, de nos perdermos no escuro
Branco, da paz, de êxtases prolongados…e múltiplos
E de todas as tuas outras cores que se te misturam por dentro

Um dia…conto-te ao melhor pintor de Montmartre
…e deixo que te eternize. Talvez…no final da palete
…te redescubra o arco íris.


Paris, Abril 2001

Bacalhaus



O bacalhau pendurado na porta da mercearia vai acabar. È verdade…
Assim sem mais nem menos, sem avisar o povo. Era bom mas amanhã já não há.
A nova legislação vai obrigar os comerciantes e manterem o bacalhau a uma temperatura até 7º centigrados.
Ou então vamos ver o bacalhau pendurado no prego só no Inverno, e ao lado de um termómetro não vá a temperatura subir e toca a guardar o bacalhau no frigorifico.
O cliente português, maior consumidor mundial do fiel amigo - tínhamos que ser grandes nalguma coisa porra – não vai acatar a lei. Quase que ponho as mãozinhas no fogo, ou melhor nas brasas. Já estou a ver os protestos nacionais em massa, com manifestações de rua e greves gerais e de zelo. “Queremos de volta o bacalhau, senão isto está mau”, dirão em uníssono, ricos e pobres, jet setes e patrícios, tias e padrinhos, homens e mulheres, velhos e novos, desportistas e acamados, autarcas e presidentes de clubes, árbitros e jogadores, todos os académicos do bacalhau e turistas. Acho que depois do euro o bacalhau nos vai unir de novo e por inteiro, à volta do cheirinho único. Manifs de rua em tudo quanto é cidade vila e aldeia deste Portugal que sempre comeu bacalhau. Cartazes, panfletos, megafones, bacalhaus em punho, petições, mulheres e homens solidários com a causa sem tomarem banho há 3 meses, porque esta será uma de causas…o povo unido pelo bacalhau. Vigílias à porta de S. Bento que será forrada a bacalhau virtual…porque as reservas se estão a esgotar e dentro de anos acabou-se.
Não vai haver ministro a livrar-se de uma bacalhauzada na tromba dado por uma varina de avental preto e moedas a tilintar.
Se até hoje ninguém morreu por causa do bacalhau pendurado porque é que agora alguém acordou com dores de barriga e pensou que era do bacalhau ? Não poderia ter sido do vinho? Ou do doce? Ou das voltas que deu na cama com o bacalhau da secretária logo a seguir ao jantar? Tinha que ser o bacalhau o bode espiatório.
Isto vai ser grave, vos digo eu. Privar o povo de bacalhau, impedi-lo de lhe tocar, apalpar e cheirar antes de comprar não vai ter um final feliz . A menos que o objectivo seja de preservar as reservas mundiais deste pescado. Mas também não me parece. Se assim for em vez de trutas começamos a produzir bacalhau de cativeiro. Até não seria mal pensado…o pessoal lavava-se menos, poupava-se água, e as Etar fariam um acordo com os viveiros. O cheirinho a bacalhau seria borrifado no peixinho depois de seco e teríamos um genuíno bacalhau de produção nacional assim se completando o ciclo alimentar.
Ao que se sabe…porque isto de previsões tem que se lhe diga, apenas vão poder ser considerados e vendidos como tal três tipos de bacalhau, tudo o resto será por exemplo, “pescado salgado seco”…o que não vai dar jeito nenhum…imagine-se uma ementa – pescado salgado seco à Braz , pescado salgado seco com batatas a murro, pescado salgado seco com natas, punhetas de pescado salgado seco …conseguem imaginar? Eu também não.
Ahhhh e será que a SPA vai obrigar o Quim a trocar a letra do “bacalhau da Maria” por “pescado salgado seco da Maria”? A menos que o dela seja de uma casta do Mar de Barents.

Vou passar pela mercearia da Ivone , ver as moscas e sentir o cheiro do bacalhau pendurado. Hummmmm há lá coisa melhor que um cheirinho assim

Comboios e memórias



A memória tinha deixado no arquivo morto aqueles momentos…duas décadas e meia ou talvez mais, o cheiro a mofo e o pó que se assopra num suspiro banal.
A estação não tinha mudado… pensei antes de entrar que estava tudo na mesma. As boas memórias teimam em ser eternas, teimando em existir de forma eterna cá por dentro, o cheiro, a luz, o som, aquele burburinho da asáfama de todas as estações…mas a entrada era outra, o cheiro, a luz e o barulho também. A pedra de calçada tosca tornou-se lisa, como que para afagar o tropeção do tempo de por quem lá passa e permitir que a pressa se confunda na indiferença da caminhada. O quiosque de canto que tinha umas sandes de ovo mexido e chouriço foi trocado por uma máquina de comida plastificada e uma outra de bebidas…as paredes tornaram-se mais claras, uma empregada limpava o chão num carrinho eléctrico. Os ponteiros dos relógios de mostradores brancos e números negros, saltavam no tempo a cada segundo… ditavam partidas, chegadas, encontros e desencontros de hora marcada…atrasos, sorrisos, lágrimas….
A única semelhança para os relógios de hoje é apenas a unidade de tempo que não mudou…o segundo é exactamente o mesmo.
As pessoas entram e sentam-se e conversam e riem e olham o vazio e lêem e bocejam e coçam-se e fecham os olhos e… matam o tempo da viagem…
O apito já não é soprado na partida, mas o comboio ainda apitou antes de mais uma viagem… ainda entram mais dois viajantes. Um idoso de ar decidido de olhar grande e enérgico e um homem de meia idade de telefone na orelha.
As carruagens já não dão aquele solavanco que involuntariamente fazia agarrar-se quem estava de pé. O Cais do Sodré ficou para trás.
O castanho predominante do passado deu lugar a cores vivas deste tempo…as carruagens já não saltam a cada intervalo dos carris.
O idoso vai dialogando para si em voz baixa enquanto o olhar se perde pela janela – Filhos da puta a mim não me fazem a folha.
O homem de pé continua a falar ao telefone, indiferente ao cenário.
Santos…ouve-se uma voz feminina. Acho que fui o único a olhar para o ar, incrédulo e sorridente. O sistema teria ajudado, na altura dos bancos de napa, muita gente que perguntava se era ali que saía .
E sai meia dúzia e entram outros tantos. E o comboio volta a entregar-se à velocidade. Muito mais rápido hoje que noutro tempo.
Hão-de cá vir hão-de que digo-lhes como é – continua o idoso que colou desta vez o olhar a uma passageira obesa de cabelo comprido e peito pronunciado.
Já não se vêm árvores lá fora, a relva é mais verde desta vez, mas o cheiro a travagem ficou perdido no tempo, e os freios já não chiam no abrandar.
A insonorização impede que o ruído exterior se faça notar.
O homem de meia idade mudou de janela e continua ao telefone, parece que farto de falar - Sim sim…pois…não.
Alcântara…repete a voz feminina.
Ninguém sai e ninguém entra… Silêncio… O sinal de fechar portas… e retomamos a marcha.
Aiiiiii que vida esta – diz o idoso depois de um bocejo.
Um telefone anuncia com uma melodia personalizada uma chamada a entrar. Um homem atende pondo no chão uma mala de computador portátil – Sim…olá amor…não me vou despachar tão cedo…estou quase a chegar a Sintra…penso que não vou chegar antes da uma…eu também …- e terminou com uma intimidade imperceptível.
Estive curioso desde o principio por ver que cor teria a farda do picas…mas até agora ele não apareceu.
As curvas e o balançar ferroviário não se notam nos passageiros…era sempre motivo de risota ver os outros abanar a cabeça com os abanões dos carris, numa atitude negativista de protesto…o progresso trouxe optimismo aos passageiros.
Belém…
Ninguém sai, mas a porta abre-se entra um casal adolescente e uma senhora de bengala.
Só havia dois bancos individuais. A senhora senta-se num e a rapariga faz das pernas dele outro banco e começam dialogar em código secreto de olhares, vocabulário e beijos. A senhora olha de lado e não resiste a deixar escapar um abanar de cabeça horizontal…não provocado pelo comboio.
Pensas que vou na conversa mas estás muito enganado – continua o idoso no seu diálogo interior .
Alguns espaços estão personalizados a feltro numa arte popular de quem passa e deixa a assinatura.
Algés….
Algés?????????????????? Então e Pedrouços? Algés???????? – pergunto-me sem saber se também o disse em voz alta. Então mas o progresso anula estações e apeadeiros?????
Tive um choque emocional grave…Pedrouços deixou de existir?????
E o comboio abrandava a marcha até se imobilizar em Algés.
Sai muita gente no meio de despedidas, de sorrisos, sem atropelos, sem euforia, sem pressa. A hora não é de ponta. Deixo-me ficar até quase a porta se fechar a saborear aquele primeiro momento de uma viagem que fiz vezes sem conta a que nunca liguei nessa altura. Fiquei ali até ao ultimo segundo contado por ponteiros negros e tentar quebrar a barreira do tempo e tentar conseguir uma referência do cheiro das carruagens da CP feitas em alumínio pela Sorefame…a relembrar a estação de Algés sem túneis…apenas com o edifício da estação em tons de amarelo discreto e letras em pedra eternizadas à parede.
Saí …não cheirava nada a freios e ferro.
Num qualquer dialecto de leste uns homens despediam-se…o idoso olhou para o lado e deixou sair outro comentário no seu diálogo interior – Foda-se, estes gajos estão em todo o lado, não tivemos cá a guerra e agora temos que os aturar – disse descendo a rampa e perdendo-se no meio de outros.
O comboio seguiu viagem, discreto e em silêncio…
Eu fui descendo a rampa devagarinho tentando encontrar semelhanças de passado…em vão
Tudo é mais colorido, mais iluminado, mais prático, mais… tão diferente…
Um dia destes vou a Cascais saborear o “poucaterra” ao ritmo de outra marcha…
As coisas que se perdem com a pressa de chegar, matando o tempo…
Os velhos do Restelo até tinham alguma razão…talvez por isso lhes tenham banido o apeadeiro.

A arma do povo



“Assim se vê a força do PP”, “Santana amigo o povo está contigo”, “ O povo não quer Sócrates no poder”...
Já tinha ouvido qualquer coisa parecida há uns anos… mas se calhar estou a fazer confusão.

Nunca percebi porque é que a maioria dos eleitores se veste sempre como se fosse para a ópera, para ir votar. Nalguns casos valha a fragrância do perfume que se sobrepõe à naftalina. Gravata e casaco para eles, não esquecendo o sobretudo…Casaco de peles para elas ou imitação se os recursos forem outros.
Votar é sempre um óptimo e agradável momento para cada eleitor…seja rico ou pobre, classe média ou alta, trabalhador ou patrão. Sentimo-nos importantes porque podemos decidir o que nos apetece e votar.
O meu voto ia voltar a ser botado numa urna do burgo, depois de um afastamento geográfico duma década.
Conseguir consultar a mesa de voto que me correspondia, foi logo a primeira vitória democrática, mas de luta. Apesar de a maioria dos votantes ser de estatura que permite olhar por cima das cabeças ou do ombro na pior das hipóteses, a lista estava ainda longe a uns quatro metros… “Olha Joana a tua é a mesa 7”, “Manel Manel anda cá, a lista está ali. …Cólicença cólicença”, “Olhe não se importa diga-me lá onde é que devo ir, que eu não sei ler”, “ Ò amigo não empurre que chegamos lá todos”, “É por ali é por ali”
Depois de uns dois minutos que mais pareciam uma ditadura, lá consegui a primeira vitória pessoal em dia de eleições. Mesa 14…bolas estava difícil.
A seta indicava que era pela esquerda a mesa 14.
A escola era a mesma onde fiz o antigo ciclo preparatório. Não resisti air pelo caminho mais longo, só para rever o cenário ainda familiar mas com 30 anos de upgrade.
As árvores de “ervilhas”, descobertas para se esborrachar debaixo da secretárias dos professores quando não queríamos ter aulas…o cheiro era insuportável…um apolítica excelente, para as aulas de educação musical onde realmente tocar pífaro não era apanágio daquela turma.
O chão de alcatrão e pedra, mais escuro na época. Antigamente o material era melhor, ou seria que andávamos sem arrastar os pés para não gastar as solas e o piso?
Uma rampa que hoje faria corar de vergonha qualquer Conselho executivo…onde na altura se descia numa tábua de madeira, antecipando o actual snowboard. A juventude era muito visionária.
As balizas eram as mesma só mudou a cor da tinta. E desta vez estavam presas ao chão.
Os putos de hoje, em dias de frio e muito pouca vontade de fazer desporto, já não as podem esconder para não haver jogo…nem precisam até porque o futebol se tornou ainda mais popular e não me admiraria que fizessem greve só para poder jogar.
Mesa 14…no primeiro andar. Subi as escadas… 18, 17, 16, 15, cheguei. Dois eleitores antes de mim, as outras salas estavam pelo menos 20 à espera.
A sala era especial. A primeira em que tive uma aula no ciclo preparatório, ainda com dois quadros do presidente da republica e do primeiro ministro da altura. Depois naquele curtíssimo compasso de espera talvez por dois eleitores indecisos, lembrei-me estranhamente da primeira frase da professora:
“Bom dia eu sou a vossa professora de português e este momento é muito importante para todos vocês”… e fiquei por lá nessa memória do tempo.
“Se faz favor”, acho que repetiu duas vezes o presidente da mesa. E lá dei o BI e cartão de eleitor…votei…entreguei o boletim perguntei se me davam um para por no blog, toda a gente ficou a olhar uns para os outros, sorriso amarelo, e não insisti...
Voltei a percorrer alguns dos corredores, as zonas do recreio em terra onde se jogava ao berlinde eram agora em pedra. As traseiras do pavilhão onde se davam umas passas de 3 vintes e 2002, serviam também para jogar ao bate pé e ganhar uns beijinhos.

Tive a brilhante ideia de ir até à escola primária, não muito longe dali. Em dia de eleições com sorte também devia estar a ser utilizada para mesas de voto…e estava mesmo. Os azulejos eram os da época, as carteiras mudaram …e nunca vi aquela escola com tanto adulto no recreio. Dantes eram só putos no masculino.
Se cada momento cívico tivesse o gosto destas saborosas visitas, acho que a percentagem de abstencionistas se aproximava do zero.

Olé



Ninguém me tira da ideia que além de estar tudo quase de pilinha ao léu devido ao tamanho minúsculo da tanga, estamos a sofrer uma macumba qualquer. É verdade que deixei de ver trevos de quatro folhas há muitos anos…na altura não me apercebi, mas a sorte deve ter fugido para outras paragens…se calhar dentro de uma das malas de cartão dos felizes contemplados do euro milhões…ou seja, para parte incerta.
E como se isto não fosse suficiente…até porque a sorte além de ter deixado o burgo, deixou também de certeza o resto do planeta azul, valha-nos a esperança que haja vida noutras paragens ou dimensões, e que nos venham cá dar uma mãozinha ó faxavor.
O Nostradamus não terá previsto isto num canhanho qualquer?

O Durão fez-nos um manguito, cagou nisto e emigrou…O Santana chegou-se à frente saltou para a arena e ao jeito dos amadores de Santarém pôs-se a caras com o toiro para uma pega das ditas, mas o boi era bem mais pequeno ao longe…”Eh toiro… eh ehhhhh”.
Uma pega e peras, nunca vista na história tauromáquica portuguesa…o toiro só parou quando espetou os cornos nas tábuas, e por lá ficou por tempo indeterminado. Os forcados não lhe tocaram num pelinho, foi um “desvia-te que isto não tem que me tocar a mim”….e as bancadas aplaudiram…nunca houve outra igual… parar o toiro sem lhe tocar…”à ganda Santana…olé”.
Na bancada presidencial o Sr. Sampaio não gostou porque ou se vai ao bicho ou aquilo não é espectáculo, e vai de lhe retirar a faixa de forcado. E o país vai a votos.

Sócrates… o nosso, não o outro…antes fosse…mas enfim…Sócrates foi visitar o Durão que tinha criticado por ter abandonado a tourada a meio e felicitou-o por ser o numero um da arena europeia e disse que era importante ter um português a tocar a corneta no começo de cada corrida.
Freitas, um outro exforcado da antiga corrida à portuguesa e adepto de outras touradas em tempos que já lá vão, apela agora ao voto em Sócrates, aspirante a forcado do mesmo grupo do seu adversário em corridas passadas e diz que o Sócrates é que é bom.
A ala direita ofende-se, a ala esquerda goza a situação, o bloco mais à esquerda faz um comentário digno de prémio Nobel, a esquerda histórica diz que Freitas está já a subir o primeiro degrau para a praça de Belém e o centro também conhecido como zona da virtude, e agora mais popular que nunca, diz que o homem já se enganou várias vezes e que já perdeu o estofo de forcado há muito tempo.

Os aficionados estão já ao rubro e a tourada nem começou…o homem do trompete também ainda não chegou nem se sabe se virá…eles e elas olham-se pelo canto do olho…e sorriem, e deitam a língua de fora e compram queijadas e o espectáculo nunca mais começa e vai mais uma bjeca, e um pastelinho de bacalhau e as roupas coloridas e um faduncho pránimar e um charuto do Fidel e ó querida estás tão sexy…e continuam a fazer sala…

Ò chefe Jorge chame mas é as chocas, que levem estes peões de brega daqui pra fora e acabem com a tourada.




Amores cozinhados



“Segundo uma sondagem feita nas principais cidades portuguesas os objectivos delas são bem diferentes dos deles…elas mostram interesse em encontrar um bonito, inteligente, e em boa forma física…eles nem por isso preferem uma mulher que se pareça com a mãe, na actitude do dia a dia e na capacidade para gerir e cuidar da casa e da família…”
As palavras eram ditas por uma voz de jornalista num serviço de informação de uma rádio.
Fiquei meio de boca aberta…acho que isto mais dia menos dia vou ter que fazer um seguro contra traumatismos maxilares… mas sondagens para quê já se sabe isto desde a idade da pedra…
Que elas queiram os homens bonitos, inteligentes e em boa forma física até percebo, até porque não anda uma mulher que se preze a gastar uma fortuna em ginásios, spa’s e outras modernices que só engordam as contas bancárias dos profissionais do bem estar feminino, em vão. Até porque esses “prazeres solitários” tem único objectivo torná-las mais belas e adiar o prazo de validade. Por isso é natural que queiram alguém que com elas se pareça.
Já os gajos não tem a mesma capacidade para o investimento pessoal…querem alguém que lhes trate das meias e faça aqueles pratinhos de arroz doce ou sopa de feijão encarnado ou ainda que lhes tirem as sementes dos tomates…falo de legumes, entenda-se.
É que para um gajo seja em que idade for…há lá coisa melhor que os miminhos de mãe.
Permite-me esta sondagem, pensar que afinal os momentos íntimos da mulher, companheira, ou namorada valem realmente muito pouco…o que até “encaixa” numa certa e generalizada lógica masculina: É ou não verdade que para elas,um gajo depois de uma boa queca, tem tendência em virar-se para o lado? É ou não verdade que a reduzida percentagem que vai a um ginásio é motivado pela possibilidade de haver por lá gajas? É ou não verdade que o perfume caro é adoptado como um substituto “fashion” do banhinho matinal? Mas é claro que os popós de dois lugares só servem e são comprados em leasing exclusivamente para passear a mães em jeito de eterno agradecimento pelas papinhas de infância na idade pseudo adulta relembradas no almoço matinal e domingueiro…ou será a desculpa que ele arranja porque a sogra não gosta da mulher nem com molho de tomate?.
De resto é cada vez mais frequente elas ( mulheres, companheiras, ou namoradas) ouvirem ao ouvido e sussurradas palavras do tipo…
“ Ahhhh minha pantera incansável…um dia destes tens que me fazer um bacalhau com natas”, “ oh sereia dos meus mares, depois desta noite inesquecível, que dirias a preparares-me com todo o outro amor que há em ti uma feijoada à moda do Porto” ou ainda “ querida tu nem sabes o que me excitava o paladar olhar-te para esse corpo embrulhado num avental e assistir às tuas mãos a criarem uma caldeirada com aquele molhinho que me deixaram de herança”…
Porque um homem depois daquela energia toda tem fome porra. É normal o desgaste existe, e ele tem que ser reparado.
De resto é tudo uma questão de comida.
Depois, ela por que ele engordou e comprou um televisor do tamanho da sala e ele porque ela ficou mais bonita e escultural, e logo arranjou um amante…o final da historia muda alguns anos depois…divorcio amigável.
Ele voltou para casa da mãe, ela foi morar para fora com o ex amante e agora futuro marido que já lhe prometeu um cheque assinado para ela gastar numa cozinha de sonho.

FIM

in...sónia

Hoje deitei-me bastante mais cedo…com as galinhas. Mas porque será que não se diz com os pardais? Que se deitam ainda mais cedo se erguem também cedo?…mas nem por isso os vi crescer mais nestes anos todos…enfim.
Revi toda a estratégia profissional da semana.
Mentalmente tentei memorizar todas as tarefas, para segunda e seguintes.
Voltei a vaguear por coisas sem importância e outras mais a sério…como acho que todos fazemos naquele dorme não dorme, no quentinho do edredão, esperando por Morpheu numa fria noite de Janeiro.
Olhar o escuro de olhos abertos ou fechados e reparar que afinal não muda nada…nessa altura tudo é negro. As coisas que se aprendem num abrir e fechar de olhos.
Tentei o truque secular do copinho de leite morno…e nada.
Restava-me o último da cartola…contar carneirinhos…1, 2, 3…346…531…998, 999, 1000. E claro que com tanto carneiro o barulho era insuportável. E levantei-me.
O gesto de ligar a caixinha das surpresas, não poderia ter caído melhor.
Carreguei no comando sem me preocupar…venha o que vier. E caí na três …fui fazer um cházinho…e ouvi alguém a dizer poesia…sabia que a voz me era familiar…tinha um remoto e pré-histórico toque de Villaret…mas aquela voz, intrigou-me a ponto de tornar precoce a infusão de lucialima e instalar-me no sofá frente ao televisor…já repararam T E L E V I S O R, pode ser feminino e masculino?…
E eis que me deparo com um gajo do norte, presidente do FCP de lágrima ao canto do olho( o Bonga não ía achar piada, sendo ele vermelho crónico) a dizer poesia carago… O homem afinal é sensíbel…devaixo daquele jogo de cintura e de parlapié…fiquei como diria uma graaaaaaande amiga de longa data…abasurdido…a poesia durou e durou…e nem sequer sei quando tinha começado…mas que o Pinto da Costa chorou isso chorou, porra que eu vi… Não me lembro de ter respirado durante a poesia, mas lembro-me que fiquei de boca aberta…o que me provocou uma dor na dobradiça dos maxilares…Pinto da Costa olé olé…e fiquei sem preceber porque é que o senhor oxigenado foi entregar um ramo de rosas azuis e brancas à esposa…ou namorada, ou seja o que for…do PdC.
Zapei dali para fora
Logo no canal a seguir em jeito de conferência de imprensa estavam umas meninas e uns meninos a fazer perguntas…só percebi depois que era da mais recente importação da TVI…mas aquilo não tinha já acabado? Percebi que sim…mas tal como as telenovelas têm as cenas dos próximos capítulos, aquela só para ser inovadora era uma cena esmifrada, espremida, sugada, sorvida…uma verdadeira masturbação colectiva inspirada no que já tinha acontecido…ou melhor, uma tentativa de queca pós queca quando tudo já está mole e bedunhento…o meu maxilar sofreu o equivalente a mais uma década de vida ali mesmo em dois ou três minutos que me pareceram uma eternidade…
Tentei os canais noutras línguas…
Um gajo pendurado por anzóis ou lá o que era, ainda mereceu uns 10 segundos de visionamento…
Os 3 duques em alemão…um must.
Um erotismo deslavado num dialecto de leste…e saturado de cor, mais parecia filmado no nevoeiro londrino.
Dissertações sobre a importância de um nó no anzol para trutas… isto hoje anzóis é que está a dar.
Um casal de maduros…ela bastante mais madura que ele…e quase a cair de madura…mas com uma particularidade extraordinária, era bilingue permanente… acho mesmo que pela aparência tinha era 3 cerebros a funcionar ao mesmo tempo…porque se ouvia, ora uns suspiros com diferentes timbres, ora umas frases que depreendo que seriam de prazer…e intenso…para se exprimir assim em duas línguas.
Achei pela primeira vez percebi o martírio que deve ser uma insónia.
Bebi o cházinho já com a TV apagada no silêncio provocado…
Voltei para o edredão e jurei a mim mesmo que nem que tivesse que mandar vir carneiros extraterrestres dali ninguém me tirava…
4678, 4679….zzzzzzzzzzzzzz

Laranjada fresquinha...é pó menino é pá meninaaaa...



O primeiro fundou mas desapareceu, o segundo nem vai chegar a aparecer para o próximo copinho, do terceiro viu-se pouco, no quarto ...hum... no quarto acho que....hum...como direi...é asim uma espécie de ...deixa ver...hum...pois, o quinto apareceu, desapareceu e foi fazer laranjada para outro quiosque.
Ai que saudades que eu tenho daqueles refrescos de capilé, groselha, limonadas...aquilo sim eram bebidas fresquinhas e saborosas...até aparecerem estes concentrados modernos de prazo de validade caducado logo à nascença.

Um instrumento de Jazz

A primeira bacurada deste ano novo foi no jornal público televisivo e logo no dia 1.
A repórter estava no casino do Estoril de microfone em punho para uma peça sobre a actuação de Woody Allen no reveillon do jet 7. Perguntou a varias carinhas da sociedade da linha e arredores, e as repostas hesitavam entre o saxofone e o clarinete.
Até que uma tia de bolsinha dourada, 255 gramas de base e casaco de peles por cima de um decote infinito, teve também o seu momento de glória televisivo:
A repórter – Sabe que instrumento é que toca o Woody Allen ?
A tia - Sim claro toca jazz…
Conclui-se portanto que ela confundiu instrumento, com estilo…ou teve muito pouco estilo na resposta acerca do instrumento…ou será que preferia que o instrumento tivesse mais estilo?...ou ainda que o estilo não interessa nada, o que importa é o instrumento…
Mas mesmo assim vai tudo para o casino ver o WA…mas…será que sabem que vão ver o homem tocar no instrumento? Ou pensam que vão ao cinema e levam um baldinho de pipocas ?
Viva 2005