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Património



Eu nunca tive nada contra os meus profs e profas…- porque hoje em dia estamos a adoptar a citação personalizada…eu que achava que os franceses ao dizerem “cidadãos e cidadãs”, “caros amigos e amigas”, “bom dia a todos e a todas” era uma perfeita pirosice, agora a prática institucionalizou-se e até o nosso primeiro já o diz…enfim adiante - até porque os profs que tive sempre foram bué de fixes, a começar pelo da primária que ainda me lembro, tinha regularmente um jornal clandestino dentro da pasta que punha metodicamente ao lado da cadeira de madeira rangente. Só anos mais tarde percebi porque é que um dia, em que ele não tinha o dito jornal entraram uns senhores ditos inspectores que vieram ver se os nossos cadernos e o do prof, estavam em ordem, só me lembro disso porque tinham um ar de “man’s in black” altamente.
Foram 4 anos de bons princípios e uma preparação excelente. Aquela sala 9 da Escola Conde Ferreira foi sempre assim e eu fui a terceira geração da família a estudar lá. Ainda existe e ainda bem, só que a cal deu lugar a tintas mais modernas e sem cheiro, para não falar no alcatrão que tapou para a posteridade a calçada de ardósia irregular, motivo de muitos dentes partidos e de infindáveis desenhos abstratos a giz…lembro-me que uma vez quisemos bater o recorde de, durante um intervalo, fazer um autêntico tabuleiro de xadrez pedra sim pedra não, a giz…mas a tentativa não deu em guiness.
Depois os únicos “pequenos” problemas com o corpo docente foram só alguns anos mais tarde quando um professor de matemática insistia para que eu me penteasse antes de entrar na aula, e eu resolvi o problema com um elástico no cabelo, um dia fui ao gabinete do director – o colégio era diocesano e estava tudo dito – ele tentou convencer-me de que eu não era uma menina para ter um rabo de cavalo com elástico…e que ninguém na escola tinha o cabelo tão comprido.Passados alguns meses já havia uma dúzia de “meninos” a ter rabo de cavalo de menina...
Outro incidente de percurso foi com uma professora de francês, muito competente reconheço, mas que nunca foi com a minha cara, e por vezes quando entrava na aula tinha a sensação que não valia a pena fechar sequer a porta, porque dali a pouco estava a sair prematuramente da aula, foi de resto o que aconteceu muitas vezes:
A juntar a isto e fora os problemas normais de todos os alunos (ah e alunas), tive um período escolar sem sobressaltos, e até me tornei amigo do director, uma vez que as visitas se tornaram frequentes…um padre que tocava harmónica e gostava de blues não era todos os dias que se podia ver e ouvir a fazer jams com o grupinho caloiro que tocava 3 acordes tipo Ramones ao fundo do pátio, para impressionar as chavalas e uma professora de filosofia. Claro que o cabelo comprido completava o status.
Os vinils mais trocados para gravar em cassete eram : “The wall”, “Comes alive”, “The dark side of the moon”, “The crime of the century”,com o movimento do “rock português” a aparecer pouco tempo depois. O núcleo musicalmente duro do colégio trocava também outros géneros como Purple, Zep, Sabbath, Motorhead e outros harders dessa onda….
Depois tudo passou tão depressa e reparei que tinham passado três décadas, e eu ali, a olhar para a sala 9 da primária, onde escrevi pela primeira vez a giz, num quadro preto que contrastava com as batas brancas dos outros putos …curiosas viagens pelo tempo.