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De "costas" para o Majestic


Sempre que o Porto passa por mim, o Majestic é um destino matinal de quase culto.
E fui de novo atendido pela mesma menina simpática de cabelo escuro, óculos e rabo de cavalo:
- Faça favor de dizer ( sem sotaque).
- Uma torrada com muita manteiga , um néctar de pêra e um pastel de nata ( com sotaque, deve ela ter pensado).
Os chineses perdiam-se em cliques pela fachada, o companheiro de uma alemã sugeria que ela se pusesse na melhor pose para a foto com o café em fundo, um lavador de janelas a caminho cumprimentava toda a gente com um sorriso de homem mais feliz do mundo que faz brilhar os reflexos de quem vê montras, algumas vendedoras de rua assediavam passantes internacionais, e o resto era burburinho comum daquela hora.
Um polegar no ar sugere-me o olhar do outro lado da rua que o sol iluminava. Sigo-lhe o trilho pelo braço até ao sorriso. Começa a caminhada a passos largos na minha direcção. Creio mesmo que a cada passo o sorriso se rasgava. E nunca conseguiria travar a tempo se continuasse naquele acelerar  direito a mim. Mas as cadeiras eram de ferro forjado o que me deu alguma segurança, bem como os bancos corridos do mesmo material confiante. Nem me lembro se bloqueou os passos ali à "minha beira".
- Tás bom mano? Há quanto tempo car...( sempre com sotaque)
Fiquei a ohar para ele sem saber se de frente ou de lado.
Tira os óculos para me ver melhor.
- Sou o Lúcio mano. Não te lembras? Eu não esqueço o Nelo das Fontainhas, nem em mil anos mano.
- Acho que me estás a confundir com outra pessoa.
- Mas qual outra pessoa és tu que eu conheço-te. Fomos vizinhos em costas...fo....
- Em costas???
- Andaste com a amnésica tu? Moraste lá meio custado e eu dois.
Para me pedir alguma coisa percebi que não era. Mas a conversa deixa-me curioso.
- Meio custado?
Depois de um sorriso desconfiado de sobrolho franzido diz-me:
- Tás-ma fo... Em Costas mano. Não me digas que te perdeste.
- Mas olha que não sou eu.
Olha-me mais fixamente e diz que não com a cabeça em jeito conclusivo.
- Pardeste-te  mano. Tou-ta ver. O Chias também se perdeu. Por isso nunca meti. Mas olha gostei de te ver. Acredita.
E dá-me umas palmadas afectuosas no ombro ao levantar-se.
- Mas olha que não sou mesmo eu pá.
Ri com ar de quem está a ser enganado e diz-me já de pé a por de novo os óculos.
- Deves ser cantor tu, pois deves.
A afasta-se a passo lento, decepcionado.
Voltei ao cenário com o pousar da torrada trazido pela menina do café.

4 comentários:

Silk disse...

Muita manteiga?! E um pastel de nata??? Ai, ai, ai! Olha o colesterol mano!
Mas agora olhando bem... não sei se é do lenço atado à cabeça, se do olhar, mas Nelo assenta-te bem!
Carago! ;)

Célia Mateus disse...

Já tinha dado conta que a história se passou....umas boas gargalhadas já dei. Adorei o com sotaque e sem sotaque...e acredito piamente que aconteceu :D
Estava a postos para ouvir mais :D

Anónimo disse...

Majestic? entao ja nos cruzamos por la... tenho pena de n~~ao ter assistido a essa conversa demais!

beijo

Anónimo disse...

Mas diz-me ele confundiu-se mesmo?
Ou eras quem ele pensava?