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Ferragens

Naquele dia precisei de uns pacatos parafusos para uma bricolage sem história, banal, como outra qualquer…talvez até porque não tinha nada de mais interessante para fazer. Visitei a loja de ferragens decidi-me pelos tais, depois de escolher, após a sugestão do mesmo homem que há tantos anos os vende, dentro daquela montra de esquina, tratando por tu quase todos os que afagam a calçada do passeio vizinho, trocando como num ritual dois dedos de conversa diária. Quem diria que ele foi dos pioneiros do tratamento personalizado aos que como eu, lhe compravam porcas, parafusos, pregos e conversas com cheiro e sabor que o tempo foi diluindo. Talvez hoje essa atitude tenha outro significado que na altura se perdeu. Atender, ouvir, sugerir, escolher e até opinar com a sabedoria de muitas toneladas de ferro de todos os tipos que lhe passaram pelas mãos, hoje menos seguras, o que cada um precisa…a satisfação do cliente era o objectivo primeiro… quais conhecimentos de marketing estudado nos canhanhos, digo eu…com a certeza que nem teria a 4ª classe. E durante esta operação de me atender, que deve ter demorado no mínimo uns cinco minutos, sem espaços mortos nem falatório de vizinhança embrulhou os parafusos numa página de revista cor rosa…e lembrei que dantes eram páginas amarelas que apesar de não se lerem, se subtraiam proporcionais ao numero de clientes que por lá passavam, quem poderia imaginar o excelente método estatístico…perguntei quanto era:
Desta vez n tirou o lápis da orelha e adicionou em papel pardo. Dedilhou o teclado da máquina branca que vomitou uma fracção de rolo de papel…
- 65 cêntimos
Paguei, e agradecendo trouxe o pequeno embrulho em papel colorido com uma publicidade de creme feminino a embrulhar os parafusos. Cinco minutos de trabalho por 65 cêntimos… ainda o ouvi:
- Então pá? o teu Benfica vai de mal a pior.

2 comentários:

Anónimo disse...

... uns parafusos... folha cor de rosa... cinco minutos ...65 cêntimos... Atender, ouvir, sugerir, ...a sabedoria...
como é grande o valor do mais pequenino gesto quando é feito com amor.

anjo

Maria Arvore disse...

O aconchego de nos sentirmos numa aldeia onde todos nos conhecem até afasta a efemeridade dos dias. :)