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Cortiça


Gostei da ideia. Ou não fossemos nós o maior produtor mundial de cortiça.
As más linguas dizem que somos peritos em rolhas...mas não passam de más linguas.
Mas um bom vinho...se calhar nem precisa de ser “um bom vinho”... vem em 98% dos casos com um rolha de cortiça...já nem falo do champanhe...com aquele prazer festivo de fazer a rolha saltar. Por muito que os chineses se empenhem o bambu continuará a ser bambu e rolha lusitana a rolhar garrafas que a china também importa.
As linguas boas dizem outras coisas, dizem bem... e fazem bem.
De resto quem é quer namorar alguém com uma lingua má?
Pela lingua se prova, com a lingua se mostra o que por vezes nos apetece dizer de boca calada...quem é que pode dizer-me que nunca deitou a lingua de fora?... porque esse foi o gesto mais propício numa situação onde a palavrinha não saiu mesmo nem a sacarolhas?... Lá está, a cortiça de novo.
E quem não sentiu já aquela sensação da cortiça a impedir qualquer reacção?
Pois é...a cortiça e tudo que ela sugere está em alta de novo.
Gostei da iniciativa dos CTT em criarem um selo original feito em cortiça. E preciso bem... original porque não haverá dois iguais. A textura viva da cortiça faz a diferença em cada milimetro quadrado.
Estou deserto por escrever a alguém por essa via cada vez mais em desuso, ir comprar e lamber um selinho de cortiça para ver como é. Acho que se amoda pega ainda vamos ter provadores de selos um dia destes. Numa visão mais futurista tenho quase a certeza que um dia até os selos vão ter sabores e se organizarão provas de selos.
Pensando bem se calhar nem o vou enviar...fica na minha gaveta do património emocional. Afinal o primeiro, é sempre recordação.

A minha árvore


Pensei-me forte neste tipo de emoções. Mas não consegui travar uma lágrima teimosa.
Nessa manhã acordei com o ruido destrutivo do abate da árvore preferida da minha rua...”a minha árvore” foi assassinada. Era minha ...porque um dia quando ainda recém plantada um camião a atropelou e ficou quase no chão. Ajudei-a até estar de novo na vertical e coloquei-lhe uma tala depois de um dia inteiro tombada...era uma noite fria...e esteve ali naquele pranto que mais ninguém ouviu durante quase 24 horas. Por isso se a salvei, era minha. E depois abandonei-a por uma década apesar de a visitar todos os anos, até voltar para a olhar e lhe dizer bom dia e boa noite a cada acordar e adormecer.
Por um semáforo tudo se pode fazer...até matar árvores...Acho que a partir desse dia fiquei a detestar semáforos e jurei nunca os ajudar se um dia os vir caídos.
Lembro-me de ter pedido ao “assassino remunerado” que me cortasse uma fatia do que dela restava para guardar a mágoa de não mais a ver inteira...mas ele disse que tinha que pedir autorização á câmara...a minha vontade foi desejar que a câmara fosse de gaz e implodisse por inteiro.
Nunca disse a ninguém mas para mim continuas lá minha Árvore... e lá morrerás um dia... mas como a maioria de todas as tuas irmãs...de pé.

Passeio

Hoje passaste de novo por mim sem que te visse.
Senti-te apenas …passar.
É estranho como se pode sentir daquela forma algo que os olhos não vêm… e os sentidos não conseguem testemunhar.
Mas sei que passaste.
Sei, porque o ôdor não me engana…nunca enganou…obediente, submisso, atento e estúpidamente presente mesmo quando fica calado, apenas a tentar segredar-me baixinho e delicadamente o que sabe e me interessa ouvir. Em todas as outras vezes
fica calado e nem a respiração lhe ouço.
Passaste hoje por mim. Sei que passaste.
Não me tocaste no ombro, como de outras vezes, e fugiste antes que me voltasse. Num jogo que por vezes teimas em repetir…só porque sabes que o detesto. Mas sabes jogá-lo tão bem, que um dia, se não mudares as regras nem fizeres batota, o vou aprender para deixares de me provocar assim. Quero ver se o teu passar continua a ser tão próximo e intenso.
Amanhã se voltares…não estarei lá.

Escada...................(Audio)



Está escondida num lugar sereno e longe de se tornar banal como quase todas as escadas.
Esta é quase secreta. Olhando para cada degrau não vejo sinais de uso regular.
Apeteceu-me eternizar o momento da subida. E lembrei-me de um clássico, já de sótão...mas estranhamente actual. "Stairway to Heaven" dos Zep, que segundo rumores vão voltar aos palcos no final do ano. Fica a sugestão para a subida...ou descida.
Subir ou descer?... teremos capacidade de as ver como algo mais que meras escravas dos dois verbos activos?
O que te sugere a escada?